domingo, 30 de setembro de 2007

Este blog se inicia como um auto-incentivo a crítica, a reflexão e a criação, dentro de uma concepção de arte que busca não a glorificação de uma individualidade, mas sim a intervenção na realidade, uma luta por uma nova concepção de mundo, que dê prioridade aos sentidos e ao sentimento, a verdadeira apreciação das coisas, e não ao consumo desvairado e inócuo.
A publicação de textos aqui será constante e diária, num exercício de disciplina que leve a liberdade através do saber.
Se alguém quiser comentar ou mesmo postar algo e contribuir no enriquecimento do saber com novos pontos de vista, e só mandar uma mensagem e comunicar a sua intenção. Aqui não haverá julgamento de qualidade. Toda a criação e reflexão é válida e construtiva.

Lyra Júnior

Grandes Artistas num grande cinema!!!

Vincent Van Gogh e Kurt Cobain. Certamente, dois homens que influenciaram muito às respectivas épocas em que viveram e que ficaram para a posteridade como exemplos de gênios. Outros personagens também entraram para a História com percursos semelhantes, a escolha dos dois supracitados não é aleatória. Quero tratar aqui de duas representações cinematográficas, uma da década de 50, Sede de Viver, e outra recente, de 2005, Last Days.
Ambas tratam de enfatizar desconfortos insuportáveis com o mundo. Não obstante, em Sede de Viver, Van Gogh é tomado por uma imensa vontade de viver, de tomar o mundo para si, de captura-lo, de encontrar a convergência perfeita entre o sentimento e a expressão. Este filme é uma verdadeira homenagem a arte, enquanto ação na realidade. Assim conta-se à estória desse holandês, filho de um pastor protestante, que via na pintura e na busca incessante das cores que a natureza lhe dispunha a sua própria forma de chegar a Deus, e entre a tinta e a tela, toda a violência de uma personalidade exacerbada pelo conflito entre uma forma tradicional de perceber o mundo – familiar e religiosa – e a forma instintiva e artística de percebe-lo: sua genialidade.
Em Last Days, temos o contraponto da personalidade ultra-sensível. Aqui, Gus Van Sant, um diretor puramente autoral, um sério postulante ao lugar de grande artista, narra a estória de um astro do rock recolhido em seu universo particular, avesso a uma vida que não deseja. A linguagem cinematográfica de Van Saint ,que rompe com os paradigmas do cinema hollywoodiano com sua complicada construção labiríntica de planos-sequências, cai como uma luva para trazer as telas a grande solidão de Blake, nome do personagem inspirado em Kurt. Se Van Gogh é retrato como um homem cheio de vida que quer obsessivamente interagir com o que vê e sente à sua volta (e nessa atitude está a sua arte), temos no Blake/Kurt de Van Sant uma mente fora de um corpo, alguém cuja interação artística com o mundo levou-o ao isolamento dele. Arte em sua pura essência, mas de sentidos opostos, que acabaram levando ao mesmo fim, a fuga da vida. Só a morte deu a eles a tranqüilidade merecida.
Por trás dessas obras, dois grandes diretores de cinema – Vincent Minelli e Gus Van Sant – que sem seus instintos e sensibilidades artísticas, expressas em linguagens cinematográficas completamente distintas, não conseguiriam passar aos espectadores a percepção aproximada dos artistas aos quais tocaram.

Filmes: Last Days, 2005, Dir:Gus Van Sant.
Sede de Viver, 1956, Dir:Vincent Minelli.